segunda-feira, 26 de outubro de 2009

O destino de Buda

O destino de Buda
4ª história zen



Edvaldo Santiago


Do fragmento do texto de Osho, do livro
“DINHEIRO, TRABALHO, ESPIRITUALIDADE”.
Editora Gente, São Paulo, 2005, págs. 14-22.


Buda, o iluminado.

• Título do texto:

“A pobreza não é espiritual”.

De modo geral, o texto se refere à pobreza e à espiritualidade. A rigor, não é necessário ser pobre para ser um cidadão espiritualizado. A pobreza em si mesma não nos leva à condição de se ter espiritualidade.
Cultivou-se, por muito tempo e, ainda hoje, a idéia de pobreza ligada à espiritualidade, ao culto religioso, à piedade, à compaixão; à humildade ligada a Deus. No Oriente anda hoje se vê uma espiritualidade ligada à pobreza, o que não legitima nenhuma forma de religião ou culto de perfeição.

Também entre nós, cristãos, ainda de se nutre a esperança do pobre em alcançar o Reino. Quanto mais pobre, mais perto do Reino. Ilusão!

Por muito tempo, o versículo.

“É mais fácil um camelo passar pelo fundo duma”.
agulha do que entrar um rico no reino de Deus”. (Mt 19, 24).

Idéia absurda e fora do tempo, pensar-se assim, como se os bens, a comodidade, o conforto sejam pecados ou antiespiritualidade.

Como bem poucos, o sábio e irreverente Osho nos retrata o magistral texto “Zorba o Buda” em que descreve a alegria de viver-se a vida gozando, curtindo os prazeres da vida, sem perder-se as graças de Deus. Dançando e orando a cada momento sempre em missão de servir e de amar como Ele nos amou e nos ensinou a amar.

Viver a vida. Ação e missão concomitantes. Alegria de viver, se cantar, de meditar, cada coisa a seu tempo.

Em tese, o que se prega, o que nos espera a vida é que gozemos os prazeres do mundo ao tempo em que meditemos a nossa interioridade.
Carne e espírito não são inimigos. São partes integrantes do mesmo cidadão; merecem tratamento especial. Vida interior, vida exterior se completam, identificam-se.

Dentro do texto e tratando de assuntos espirituais, é que Osho nos conta a história do destino de Buda. Interessante e instrutiva história sobre a verdadeira espiritualidade que nada tem a ver com pobreza.

Buda, antes de ser buda, foi um Zorba.

Conta a história que Buda nasceu rei e seu pai, já velho, havia-se se preocupado com seu destino. Que fazer com tanto luxo, tanta riqueza, tanto fausto. Um único filho e o rei sem saber o que fazer com tanta riqueza.

Com a cabeça cheia de interrogações, o rei convocou todos os astrólogos do reino, a fim de lhe dizerem o destino do seu filho Buda. O que seria ele. Qual a sua vida futura. Seria um gênio, um bandido, um herói. Pouco importa o que ele seria. Precisava, isso sim, saber a que entregaria seu reino, sua fortuna, sua grandeza.

Coisa rara. Os astrólogos não sabiam o que dizer ao rei sobre o destino de Buda. A muito custo, o mais jovem dos astrólogos disse ao rei:

Majestade, nunca depararmos com coisa assim. O destino de Buda é alternativo, bipolar. Tanto ele pode ser um grande conquistador do mando, como pode renunciar ao mundo e nada dele querer ou exigir.

Pode ser um iluminado ou um mendigo. Ninguém pode aventurar-se a afirmar se ele será uma coisa ou outra. O destino de Buda é alternativo, bipolar! Pertence à totalidade, tem dentro dele a interioridade e a exterioridade.

Apavorado ficou o rei com a resposta do astrólogo. Que fazer com tanta riqueza, com tantos palácios e terras e um único filho?

Indeciso, com receio de dar sua sugestão ou conselho, o astrólogo falou

- Para que ele não renuncie ao mundo, é necessário que viva somente em torno das coisas do mundo. Buda não pode ver nada de sofrimento, de miséria ou de morte. Que se lhe dê sempre todo conforto, todo luxo, toda a grandeza em que sempre teve ao seu alcance.

Festas, mulheres, danças, todo o luxo é pouco para que ele não sinta falta de nada. Em sua volta nada que lhe cause tristeza ou sofrimento. Nos jardins que não se encontre uma folha amarelada ou morta.

Só é possível não renunciar ao mundo se não vir ou perceber coisa alguma que lhe cause dor ou sofrimento. Só o mundo exterior, o mundo em sua volta. Nada de interior, de interioridade.

Tudo combinado, tudo certo. Esta seria a vida de Buda e seu mundo exterior. Eis a lógica normal do astrólogo. Era só manter Buda em seu mundo e nada de mal lhe aconteceria. O rei ficaria satisfeito com seu filho único ate que a morte chegasse.

Todavia, a lógica do mundo e diferente da lógica divina. Há dois mundos e os dois mundos pertencem a uma totalidade. A Unidade transcendente!

Eis que um dia, inesperado e real, em passeio com o cocheiro, Buda viu um homem morto. Surpreso, chocado com o quadro, perguntou ao cocheiro o que aconteceu com o homem. Que havia com ele.

O cocheiro, receoso da resposta, lhe disse que não podia mentir. O homem estava morto. Morreu, perdeu a vida.

Foi sem limite o choque de Buda, que não conhecia nem entendia a morte. Nunca lhe haviam falado da morte. Nesse mesmo tempo, passou por ele e o cocheiro um sannyasin (um iluminado), com seu traje natural, que ia a uma reunião da juventude.

Buda, surpreso diante dessas descobertas – nada disso havia em seu mundo – demonstrou sua indignação. Fechado no mundo que seu par – rei poderoso – lhe deu, Buda jamais soube o que era morte, miséria, sofrimento, dor, compaixão. Seu mundo sempre for o de fora, o mundo exterior. Do mundo interior, da vida do espírito nada disseram a Buda ou lhe ensinaram. Daí a violenta surpresa diante do quadro que acabara de presenciar.

Imediatamente, ordenou ao cocheiro que voltasse ao palácio.

Em chegando ao palácio, mesmo tentando o cocheiro persuadi-lo ao contrário, Buda partiu, deixou o palácio, fugiu. Fugiu do seu mundo; único mundo que conhecia.

E saiu dizendo, textualmente:

“Estou partindo em busca daquilo que nunca morre”.

Assim começou a vida de Buda, o iluminado. Sidarta Gautama, o Buda.

Após todo o fausto em que viveu, não satisfeito, enjoado de tanto luxo e fartura, saiu em busca da verdadeira vida: a vida espiritual, que nunca morre.

Buda. De Zorba a Buda, o itinerário da felicidade!


Saquaíra, 15.01.2008

10.09.2009.

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